Seduzido pelas carismáticas orquídeas de Cingapura
By ecoflora In Dicas, notíciasNOVA YORK – É como ser atropelado por um caminhão de… flores. “The Orchid Show: Singapore” (Exposição de Orquídeas de Cingapura), o 17º espetáculo anual de orquídeas do Jardim Botânico de Nova York, em cartaz até 28 de abril, apresenta as espécies naturais e os destaques híbridos do sudeste asiático – mais de 70 por cento dos exemplares estão na estufa Enid A. Haupt Conservatory do jardim. Milhares delas, em centenas de variedades e em todos os possíveis, e impossíveis, formatos, tamanhos e cores.
A orquídea, outrora uma raridade aristocrática, hoje uma onipresença, ainda é a flor com aparência menos natural e que, por si só, atordoa com sua excentricidade opulenta e determinada. “Ela já passou a poinsétia como o tipo mais produzido no mundo da horticultura. É o panda do mundo das plantas – carismática, colorida, inspiradora”, pontuou Marc Hachadourian, curador sênior de orquídeas no Jardim Botânico de Nova York.
Para a mostra, a instituição americana contou com a parceria de duas entidades de Cingapura: o Jardim Botânico, cujo Jardim Nacional de Orquídeas possui a maior coleção do mundo, e o parque Gardens by the Bay, um complexo de entretenimento cujo foco são os jardins e onde foi filmada a festa de casamento que encerra o filme “Podres de Ricos”. Cingapura, que em certo momento se autodeclarou “uma cidade-jardim”, agora mudou a denominação para “uma cidade dentro de um jardim”. A orquídea, produzida em série e muito hibridizada para sustentar o grande mercado exportador, é a flor nacional da cidade-Estado.
Em um passeio recente pela estufa, ficou difícil não pensar em Hachadourian como o Mágico de Oz, perseguindo as riquezas perfeitas e inimagináveis de seu reino. “Vanda, Dendrobium, Cymbidium, Phalaenopsis e Paphiopedilum”, ele listou, usando a classificação em latim do botânico Lineu com a mesma destreza com que um garçom lê os pratos do dia, enquanto apontava para as amostras, que mais pareciam joias, à esquerda e à direita. Foi uma experiência estranhamente extraordinária, como se tudo que fosse mundano tivesse recebido tratamento no Photoshop: uma cidade esmeralda em filtros do Instagram produzida por um tipo de Pokémon planta-fantasma.
A responsável pela nova popularização das orquídeas é a Phalaenopsis, que inclusive aparece estampada em roupas da Calvin Klein. Conhecida como a orquídea dos mercados, é barata e fácil de achar, além de ser a estrela do marketing de todo tipo de produto, desde camisinhas de luxo até spas e supermercados. A destronada cattleya é a orquídea para adornos com ares de avó usada para confecção de corsages. Proust tem uma na lapela em seu famoso retrato de 1892, feito por Jacques-Émile Blanche.
Graças à altivez e à modernidade do fenômeno Phalaenopsis, todos estão agora se arriscando no cultivo de orquídeas, deixando de lado o medo da jardinagem, enquanto as orquídeas perdem o estigma de difíceis de cultivar.
“Tenho uma sapatinho (Cypripedium) e uma Phalaenopsis”, contou a dra. Michelle Montenegro, que visitava a estufa com uma amiga, a dra. Alec Petrie. As duas são médicas atendentes em um pronto-socorro do Bronx. Montenegro adquiriu as suas na exposição do ano passado. “Elas estão realmente vivas”, declarou com uma risada incrédula quando perguntei sobre a saúde delas. A médica construiu um parapeito especial para as flores na janela. “O parapeito está definitivamente ajudando”, completou.
“Já matei muitas plantas. Sou melhor com pessoas”, argumentou Petrie, enquanto Montenegro tentava convencê-la a ter uma. Ela sorriu. “Hoje é o dia, estou lhe dizendo”, incentivou Montenegro. A próxima parada das duas foi a loja do local.
A exibição tem duas atrações principais. Uma dupla de superárvores – armações de aço com cinco metros e meio de altura que imitam árvores reais – são versões das superárvores artificiais encontradas no vasto bosque do Gardens by the Bay. As originais medem cerca de 50 metros de altura e sua copa forma uma espécie de via celeste. Ademais, são cobertas por células fotovoltaicas que coletam energia – como as árvores vivas –, que é usada para alimentar displays de luz noturnos que são sincronizados com música. Para arrematar, estão envoltas, do topo à base, em uma folhagem que parece de outro mundo.
“É um tipo de Disneylândia para os amantes das plantas. As orquídeas que exibimos no interior das estufas são as que crescem do lado de fora. É alucinante”, descreveu Karen Daubmann, vice-presidente associada de exposições que visitou o Gardens by the Bay e atuou no trabalho de reprodução das superárvores em Nova York.
Como as de Cingapura, as superárvores nova-iorquinas foram projetadas para exibir uma classe particularmente espetacular de espécimes mesmo para os trópicos: as epífitas, ou plantas que não crescem na terra, mas sim nas árvores. “É uma comunidade estranha, que evoluiu para essencialmente escalar árvores a fim de conseguir a melhor luz, água e umidade possíveis”, esclareceu Hachadourian. São tipos alfa de orquídeas, as acrobatas do reino das plantas.
George Poinar Jr., professor emérito da Universidade do Estado do Oregon, foi o principal autor de um estudo de 2017 que determinou a atual idade da orquídea: entre 45 e 55 milhões de anos, 25 milhões de anos mais velha do que se acreditava anteriormente. A um periódico científico, declarou: “Provavelmente, não deveríamos dizer isso sobre uma planta, mas as orquídeas são muito espertas.”
A outra atração central da mostra, inspirada no Jardim Nacional das Orquídeas de Cingapura, é uma alameda, coberta por arcos dos quais pendem orquídeas, que leva à cúpula principal da estufa. As cores passeiam em um espectro que vai do amarelo – da orquídea Oncidium, ou “Chuva de Ouro” – ao cor-de-rosa e a tons mais quentes e escuros. É como andar sob um arco-íris.
“A ‘Liga das Vandaceous’ é um grupo de orquídeas quase que específicas de Cingapura”, justificou Hachadourian sobre a presença particularmente massiva do tipo na exposição.
A flor nacional do país sul-asiático é a Vanda “Srta. Joaquim”, batizada em homenagem à mulher que a desenvolveu no século 19: uma das primeiras híbridas artificialmente produzidas e que ainda segue sendo cultivada.
Seguindo a tradição de homenagear pessoas com cultivos personalizados (existem, por exemplo, orquídeas para primeiras-damas, desde a “Sra. Herbert Hoover” à Rhyncholaeliocattleya de cor fúcsia “Melania Trump”), o Jardim Botânico de Nova York expôs a Vanda “Awkwafina” para celebrar a atriz que estrelou “Podres de Ricos”. Awkwafina cresceu no Queens e se lembra de ter sido levada ao jardim no seu aniversário de quatro anos, relatou Daubmann.
Conhecer profundamente e colecionar orquídeas não são mais hábitos exclusivos de aposentados, acadêmicos ou fanáticos endinheirados como você talvez possa pensar. “Metade do meu quarto é ocupado por plantas. Há cerca de 415. O lugar é uma floresta”, contou Sebastian Trujillo, de 18 anos, que trabalha no setor de apoio a visitantes do jardim. Trujillo está no último ano do ensino médio e mora com os pais no Queens. “Agora, eles estão me ajudando a construir uma estufa no quintal de casa.”
Graças à grande popularidade, será que a orquídea – uma das personificações do conceito de raridade mais permanentes da história – corre o risco, como qualquer celebridade, da superexposição? Se a virmos em todos os lugares, perderá o sentido?
“Perguntei o que ele achava que a orquídea tem para seduzir os humanos de tal forma que eles são levados a roubá-la”, indagou Susan Orlean a um guarda-florestal na Flórida enquanto escrevia o best-seller “O Ladrão de Orquídeas – Uma história real sobre beleza e obsessão”, de 1998. “Ele respondeu, vacilante: ‘Ah, acho que mistério, beleza, a qualidade de ser indecifrável.’”
Segundo estimativa, existem 30 mil espécies selvagens no mundo todo, além das centenas de milhares de híbridas cuja produção cresce vertiginosamente. O brilho das orquídeas ainda está longe de ser apagado.
Por William L. Hamilton
Fonte: gauchazh.clicrbs.com.br